Pessoa Hora (PH) e suas variações de tempo (mês, dia, minutos) são as métricas favoritas do pessoal que utiliza modelos mais tradicionais de projetos.
Quer ouvir este conteúdo sobre Pessoa Hora? Dê o play!
Essa estimativa foi utilizada pela primeira vez em 1912 e é uma medida relativa que descreve uma unidade de uma hora de trabalho de uma pessoa. É utilizada para estimar projetos, gerir custos, dar orçamento etc.
Em diversas ocasiões vemos alguns times tentando marretá-las no Ágil. Criam fórmulas mirabolantes para converter pontos por histórias, tempo de ciclo e lead time para Pessoa Hora. Na prática não funciona, pois são métricas construídas para paradigmas diferentes.
Neste artigo falaremos de alguns motivos para você deixar de usá-la.
10 motivos para não usar Pessoa Hora
1. O trabalho do conhecimento é desconhecido até que ele seja totalmente realizado
Imagine a situação na qual você é o gerente do projeto e chega para um desenvolvedor de software e pergunta quanto tempo vai levar para criar a funcionalidade XPTO.
Ele pensa um pouco e responde: uns dois dias. No final acaba demorando uns cinco dias, pois havia coisas que ninguém se atentou sobre as tarefas necessárias para criar aquela funcionalidade.
Detalhes como muito trabalho braçal, algum algoritmo complexo que teve que ser desenvolvido ou alguma parte ainda desconhecida da codificação não foram previstos e afetaram a estimativa em dias.
Você é um bom gerente de projetos e já sabe que para tarefas similares os prazos deverão ser similares. Assim, já planeja a próxima funcionalidade com 5 Dias Pessoa.
Na execução ela dura 8 dias. Era mais complexa, mais desconhecida ou tinha muito mais trabalho braçal para ser realizado.
O que acontece é que para os trabalhadores do conhecimento, a tarefa não é conhecida até que ela seja totalmente executada.
Tentar estimar quanto tempo dura uma atividade criativa é como pegar um conjunto de dados, lançar e esperar que saia o número 6 em todos. Em algumas jogadas você pode até acertar, mas na maioria você vai errar.
2. Tempo Absoluto X Tempo Relativo
Horas em um dia é um tempo absoluto. Como dito por Henrik Kniberg, é o recurso mais padronizado, abundante e barato do planeta.
Se considerarmos o tempo de trabalho, normalmente temos 8 horas por dia. Podemos aplicar um fator de ajuste e dizer que cada pessoa trabalha 5-6 horas por dia descontando pausas e interrupções.
Essa estimativa de trabalho é absoluta. Cada pessoa trabalhando exatamente de 5 a 6 horas por dia.
Na prática há muita variação. Alguns dias, algumas pessoas podem trabalhar 10 horas por dia, enquanto em outros essa mesma pessoa pode trabalhar 1 hora ou nenhuma.
Para o planejamento em Pessoa Hora essa é uma briga eterna para encaixar um no outro. Quantas vezes o plano é refeito porque alguma tarefa demorou mais tempo do que o estimado?
3. Dia perfeito
Isso nos leva ao fato de que nem todo dia é perfeito.
Filhos doentes, brigas com o cônjuge, situações familiares, internet que vive caindo, problemas particulares etc.
Tudo isso afeta significativamente a Hora da pessoa.
4. A Pessoa perfeita
A métrica de Pessoa Hora considera que a pessoa é perfeita e padronizado. Por exemplo, desenvolvedores de software plenos têm sempre um rendimento X.
Bem, já tentou apresentar um problema que essa pessoa nunca enfrentou antes? Uma nova linguagem de programação? Todos os plenos respondem da mesma forma frente a um desafio?
As pessoas não são perfeitas. Elas têm fraquezas, medos, anseios, dificuldades que as impedem de render sempre da mesma forma.
5. Dá a falsa noção de que pessoa é igual a recurso
Há algum tempo lembro de estar numa conversa e o interlocutor disse a seguinte frase: “As pessoas não são insubstituíveis, se o processo for bom mesmo, pode trocar à vontade que a produtividade não cai”.
Questionei se isso se aplicava a ambientes complexos e ele disse: “Claro!”.
Num momento de epifania pensei no time de futebol do Barcelona, que até então era o melhor do mundo. Perguntei: “Então podemos trocar o Neymar pelo Juca Pé de Foice (jogador fictício) que o Barcelona continuará sendo o melhor time do mundo”.
Ele parou com a cara de assustado e começou a justificar que nesse caso é diferente, blá, blá blá.
Se você já foi responsável por algum time, você sabe que as pessoas são únicas. A saída de um bom profissional é um impacto tremendo no desempenho do time, pois PESSOAS NÃO SÃO RECURSOS.
Por exemplo, se o meu problema é imprimir documentos e eu tenho uma impressora que faz 30 páginas por minuto, se eu comprar outra impressora igual minha capacidade passa a ser 60 páginas por minuto.
O mesmo não acontece com pessoas. Elas têm habilidades, capacidades, atitudes e histórias diferentes.
6. Se o prazo está apertado, adiciona mais pessoas
Quantas vezes já vi e vivi essa situação. O escopo já foi fechado e o prazo final está chegando, o time já está trabalhando loucamente.
Horas extras já estão na estratosfera e aí vem a ideia: o que faremos para aumentar a produtividade? Vamos contratar mais gente!
A primeira observação é que quando a pessoa entra em um projeto, não necessariamente está familiarizada com as ferramentas, contexto e time em que vai atuar. Alguém vai ter que ajudá-la inicialmente e haverá, num momento inicial, uma perda de desempenho.
A segunda foi feita por Frederick Brooks no clássico livro The Mytical Man-Month (1995). Ele escreve que adicionar pessoas para aumentar a produtividade de um time tem alguns efeitos colaterais.
O custo de coordenação, comunicação e a complexidade aumentam com um fator exponencial (Fórmula de Brooks). Com o tempo esses efeitos são tão grandes que ao invés de ganho de performance, você começa a ter perda.
7. Estimula a mentira
Você já perguntou para alguma pessoa do projeto quanto tempo durou a tarefa e ela respondeu algo como 8 dias, 6 hora e 20 minutos?
Provavelmente ela está tentando ajustar a execução ao que foi estimado. É raro as pessoas manterem esse nível de precisão do tempo.
Faça um teste: há quanto tempo você está lendo este artigo?
8. Favorece as comparações individuais
No artigo Métricas Tóxicas discutimos os perigos de medir o trabalho do indivíduo em vez do time. Lá escrevi como esse tipo de métrica acaba reduzindo o compartilhamento de informações e ajuda mútua.
Consequentemente, aumenta a competitividade dentro do trabalho que, a princípio, deveria ser colaborativo.
9. Lei de Parkinson
Se você bota aquela gordurinha no Pessoa Dia, saiba que pode rolar a Lei de Parkinson: “O uso do recurso se expande para a sua disponibilidade”.
Funciona assim: você pega uma tarefa, imagina que ela vai durar 5 dias, mas coloca uma gordurinha de mais 2 dias caso dê alguma coisa errada. Você agora tem uma previsão de 7 dias com uma pessoa fazendo a tarefa.
Duas coisas podem acontecer. A primeira é a Síndrome do Estudante, em que a tarefa começa a ser feita no dia 6, pois até então o time estava fazendo outra coisa e essa ainda tinha um tempinho sobrando.
A segunda é o capricho em excesso em que a tarefa até começa no dia 1, mas o pessoal vai colocando um monte de funcionalidades extras (gold plating) que não foram pedidas e não são desejadas pelo cliente.
O resultado é sempre a tarefa e, consequentemente, o projeto atrasados.
10. Aritmética difícil
Antes do projeto começar, normalmente é tudo muito bacana. Tarefa A = 10 dias, Tarefa B = 5 dias, Tarefa C = 1 mês, e por aí vai.
Quando o projeto começa, começam também os ajustes, e a coisa fica algo como 10d + 1,5d + 2h + 1,3M = ???
Mas quando o projeto vai ficar pronto?
Essa não é a pergunta mais importante!
No artigo “Quando fica pronto?” não é a pergunta mais importante, Rodrigo de Toledo explica porque essa pergunta não tem tanto peso em Métodos Ágeis.
Conclusão
Pessoa Dia é normalmente utilizado em modelos direcionados ao planejamento (Plan Driven Development) no qual o esforço de criar o plano do projeto o mais perfeito possível e com a menor quantidade de risco é muito maior do que o esforço de execução.
A busca pela previsibilidade é tão grande que a adaptação a mudanças normalmente é lenta, burocrática e por vezes impossível.
Já em Métodos Ágeis entendemos que é impossível ter um plano perfeito. A melhor forma de mitigar risco é entregar o que é mais importante primeiro e entender que mudanças vão ocorrer. Logo, as Métricas Ágeis devem se adequar a esse contexto.
Se você quer desbravar esse mundo e se aprofundar nas métricas, tenho uma dica: participe do Treinamento Métricas Ágeis!